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Artigo: O papel da qualidade percebida na adesão ao tratamento

Por:

Alice Selles

- 10/01/2020

Uma discussão importante nos serviços médicos é a questão da qualidade. Como pacientes, queremos um serviço de qualidade. Profissionais da Saúde e gestores de serviços médicos também querem oferecer serviços de qualidade. Isso dá satisfação, orgulho mesmo.

Afinal, o que é qualidade em um consultório ou clínica?

Muitas pessoas, em resposta a essa pergunta, enumeram alguns atributos ou preocupações, como o atendimento na hora marcada, o oferecimento de uma gama completa de serviços ou, ainda, a cordialidade e a atenção dispensada a cada paciente.

É comum, ao perguntarmos a um médico se está satisfeito com os serviços que oferece, ouvirmos uma lista de atributos como se fossem “certificados de qualidade”. Mas será mesmo que os gestores de um serviço de saúde conseguem definir os parâmetros de qualidade sem ouvir seus pacientes? Será que, de fato, não são apenas eles que podem definir o que é ou não qualidade na experiência que vivem durante o atendimento médico?

Parasuraman, Zeithaml e Berry desenvolveram o Modelo das Lacunas, por meio do qual buscam entender a questão da qualidade na prestação de serviços. Os autores definem como “lacuna” a diferença entre as expectativas e as percepções.

O raciocínio é bastante simples: quanto maior a lacuna, maior a decepção e, quanto menor a diferença entre aquilo que se espera (ou planeja) e o que se vivencia, maior a sua satisfação.

O modelo das lacunas se divide em duas vertentes. A primeira, chamada pelos autores de lacuna do cliente, trata da diferença entre as expectativas e percepções daqueles que recebem o serviço. As expectativas representam os padrões ou pontos de referência que o cliente (ou mais especificamente, no caso de serviços médicos, o paciente) traz consigo para a experiência do atendimento na clínica, ao passo que as percepções são avaliações subjetivas das experiências que ele vive antes, durante e depois de seu atendimento, e dependem da vivência que lhe é oferecida.

O preenchimento da lacuna entre o que os pacientes esperam e o que recebem é um aspecto essencial na execução de serviços de qualidade.

A segunda vertente é chamada de lacunas da empresa, e que aqui podemos entender como a distância entre aquilo que a clínica acredita, planeja, executa e diz sobre seus serviços e o que se concretiza, ou como essas ações são percebidas pelos pacientes.

  • Lacuna da compreensão do paciente: As principais fontes dessa lacuna estão em falhas nas pesquisas de marketing, na priorização de foco nos procedimentos em vez de foco nos relacionamentos, e no foco em novos pacientes em vez de foco nos pacientes com relacionamentos existentes.
  • Lacuna do projeto e dos padrões de serviço: Ocorre em função de processos de desenvolvimento de novos serviços sem sistemática ou, ainda, pelo fracasso ao relacionar o projeto com o posicionamento do serviço.
  • Lacuna do desempenho do serviço: Ocorre quando os pacientes desconhecem seus papéis (o que devem fazer para que o serviço aconteça como esperado, como horários de atendimento e retornos).
  • Lacuna da comunicação: Ocorre em função da diferença entre a comunicação externa e a rotina de atendimento da clínica.

Para determinar o que é qualidade, é preciso entender quais são as expectativas e as percepções dos pacientes, já que o preenchimento da lacuna entre o que os clientes esperam e o que recebem é um aspecto essencial na execução de serviços de qualidade.

As expectativas dos pacientes se estabelecem a partir de diversos fatores. Alguns, como o preço, a propaganda e as promessas que a ele são feitas pelo médico e pelo pessoal encarregado do atendimento, são controláveis, ou seja, o médico ou a clínica ajuda a determinar o que o paciente pode esperar dos serviços que irá receber por meio do nível de preços praticados, das imagens que o paciente vê no site, do atendimento telefônico, das instalações que encontra ao chegar na clínica e do profissionalismo demonstrado pela equipe, por exemplo.

Outros aspectos, como as necessidades pessoais de cada paciente – como o seu nível de ansiedade, sua preocupação com o problema de saúde que tem (ou imagina ter) –, a comunicação boca a boca que se estabelece entre pacientes (e que é tão significativa na formação de uma imagem positiva ou negativa), as experiências anteriores que os pacientes tiveram em outros serviços de saúde e ainda a presença e o nível da concorrência, são fatores incontroláveis.

Os fatores controláveis devem ser planejados e executados de forma que ajudem a criar e manter na mente dos pacientes atuais, e também dos potenciais, uma imagem condizente com o serviço que será oferecido, pois o paciente certamente se sentirá enganado se chegar em sua primeira consulta com expectativas elevadas, baseadas no lindo site que acessou, e encontrar sala de espera lotada, ou desordem e pouca cordialidade por parte da equipe. Se a proposta do serviço é um atendimento popular, todos os fatores controláveis do estabelecimento e das expectativas dos pacientes devem ser coerentemente planejados, para não gerar decepções.

Mas o que fazer quanto aos fatores que moldam as expectativas dos pacientes, mas que são incontroláveis?

Bem, como o termo já diz, são incontroláveis, mas podem ser reduzidos por meio de uma boa e consistente comunicação (afinal, se o paciente for informado e educado quanto ao que esperar e, ainda, quanto ao papel que lhe cabe no atendimento, será mais participativo, ficará mais satisfeito e falará bem da clínica), de um atendimento empático, de um olhar atento a tudo o que se passa na clínica, mas do lado de fora do consultório.