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Clubhouse: eu já ouvi isso antes!

Por:

José Roberto Luchetti

- 20/02/2021

clubhouse

A mídia social do momento chega causando um rebuliço na sociedade brasileira entediada com a pandemia que não acaba nunca. Nas últimas semanas, houve uma busca aflita por convites para fazer parte da mais nova sensação – praticamente como uma disputa para integrar a alta sociedade britânica do século 19, retratada em uma das séries mais baixadas da Netflix. Todo mundo quer ser um “VIP” no “seleto” Clubhouse e, quando conquista o acesso, exibe-o como um título de nobreza, com a sensação de participar do dia a dia da família Bridgerton, algo que todos almejam na fictícia história baseada nos livros da escritora Julia Quinn.

Quem recebe o honroso convite de fazer parte da comunidade do Clubhouse passa a ter o direito de convidar outros dois e, assim, a generosamente ter a mesma atitude dadivosa e atrair mais dois usuários para a plataforma. Os números do aplicativo, por enquanto disponível apenas para iOS, são superlativos. Estima-se que em menos de um ano ele atingiu mais de seis milhões de participantes. E seu valor de mercado já passa de US$ 1 bilhão.

A mídia social foi idealizada pelo empresário Paul Davison, do Vale do Silício, e por um ex-funcionário do Google, Rohan Seth, mas “bombou” de verdade e virou a sensação quando o segundo homem mais rico do mundo, o empresário sul-africano Elon Musk, dono da Tesla, decidiu participar de um bate-papo em uma das salas do Clubhouse com o presidente do aplicativo de investimentos Robinwood, Vlad Tenev.

O Clubhouse funciona mais ou menos assim: são várias salas de bate-papo simultâneas, somente em áudios e ao vivo, onde o usuário pode ser moderador, apresentador ou ouvinte. O moderador tem o controle de determinar quem e quando cada apresentador pode ou deve falar. Os ouvintes também podem participar, levantando a mão para serem ouvidos ou apenas escutando o que está rolando. Você já ouviu isso antes? Certamente sim. Mais ou menos como aquele aparelhinho no carro em que, mudando o dial, temos a possibilidade de ouvir “salas de bate-papo”, seja de notícias, música, pregação religiosa ou qualquer outro tema. O Clubhouse é um pouco ou muito do rádio, que recentemente comemorou os seus 110 anos no mundo e 99 no Brasil.

A jornalista Simone Cotta Cardoso, que trabalha com comunicação corporativa, imagem e reputação empresarial, também tem acompanhado de perto essa nova mídia. “Entrei num sábado de manhã, meio sem saber do que se tratava, sem conhecer quase ninguém que estava ali. De repente, no dia seguinte, já vi centenas de conhecidos entrando ou querendo entrar. A rede funciona como se diversas lives (que também viraram mania na pandemia) acontecessem ao mesmo tempo, porém sem o vídeo (o que ajuda muitos!) e com a possibilidade de participação, se você for notado pelo mediador. Mas, mesmo que não participe, o fato de ‘estar lá’ já aguça esse enorme público inicial, mesmo com tantas restrições”, descreve Simone.

Para ela, “tem um pouco aí daquele velho medo que as redes sociais transformaram em uma síndrome real: FOMO (fear of missing out – ou medo de ficar de fora do que está no auge). Exemplo disso é que o Clubhouse possui diversas salas ‘corporativas’ que têm atraído executivos e aspirantes, que discutem marketing, vendas, questões de RH e finanças num domingo de manhã ou num dia qualquer de madrugada ou tarde da noite. E a qualquer hora – até nas menos ‘razoáveis’ – as salas estão lotadas de pessoas animadas, falantes e cheias de conteúdo… Eu mesma já entrei em várias, muitas excelentes! Já fui host de uma sala também e achei super bacana e rica a discussão. Mas acho que ainda é cedo para avaliar o que vai sobrar disso tudo quando essa poeira da novidade baixar”, completa a jornalista.

Depois de ouvir por muitos dias, a sensação que tenho é que a frivolidade do Clubhouse é passageira. Ou seus idealizadores farão ajustes e trarão a possibilidade de as pessoas poderem ouvir não somente ao vivo. A Netflix popularizou o conceito de que o poder está nas mãos do usuário. Ele assiste ao que quer, quando quer e onde quer. Imagino que o ouvinte do Clubhouse, em breve, desejará soltar as amarras do tempo dos Bridgerton e ouvir o que quiser, quando e onde quiser.