Três mulheres em especialidades predominantemente masculinas compartilham suas experiências e celebram suas conquistas no cenário médico
No Brasil, 46,6% dos médicos são mulheres, de acordo com dados da última versão da Demografia Médica, estudo produzido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em parceria com a Universidade de São Paulo (USP). Mesmo em número tão expressivo, das 55 especialidades médicas, apenas cinco contam com uma maioria feminina.
A discrepância entre homens e mulheres nas especialidades não chega a ser tão grande em todos os casos. Todavia, em algumas especialidades essa diferença chama bastante atenção, como é o caso da Urologia, da Ortopedia e da Neurocirurgia, as três especialidades com menor representatividade feminina.
Uma mulher atuando nessas especialidades pode não ser o mais comum, mas é completamente possível. Por isso, neste 8 de março – Dia Internacional das Mulheres, mais do que falar sobre o assunto, o Universo DOC convida três profissionais das especialidades acima – Miriam Dambros, Bárbara Drumond e Tatiana Protzenko – para compartilhar suas experiências e mostrar que, com muita força e dedicação, as mulheres podem e têm chegado aonde menos se espera.
Caminho natural
A neurocirurgiã pediátrica Tatiana Protzenko, do Rio de Janeiro, especialista formada pelo Instituto Fernandes Figueira em 2011, conta que a escolha pela Neurocirurgia veio naturalmente. “Me fascinei já no primeiro ano pela neuroanatomia”, destaca a profissional. A médica também pontua que ser minoria nunca foi impeditivo, pois seu maior exemplo veio de casa.
“Minha mãe sempre foi muito pragmática. Uma mulher muito forte, chefe de serviço, um grande exemplo. Então, acho que pela forma que fui ensinada, isso nunca me pareceu um impeditivo”, destaca. Para Tatiana, o foco sempre foram os estudos e não existe outra possibilidade ao seguir em uma especialidade. “Não tem outra receita: é sentar, estudar e, quando você achar que estudou muito, estude mais”, assegura.
Vencendo resistências
Miriam Dambros, de São Paulo, também se apaixonou ainda nos primeiros anos de faculdade pela Urologia. Ela conta que, em sua experiência, encontrou certa resistência quando ao fazer sua escolha. “Em um primeiro momento, como aluna e também como residente de Urologia, colegas e até preceptores tentaram mostrar a dificuldade de ser urologista em um universo muito masculino”, conta a especialista. Entretanto, assim como Tatiana, Miriam não perdeu a coragem e encontrou nos estudos e na dedicação a força para se tornar uma boa profissional.
“Minha postura foi firme e tentei fortalecer ao máximo minha vida acadêmica. Me envolvi em diversos trabalhos de pesquisa, participei de muitos congressos e grupos de estudo, entrei em duas pós-graduações, fiz doutorado fora do Brasil e fui professora. Não sei dizer o quanto essa decisão de fortalecimento acadêmico foi importante para hoje exercer a profissão de forma firme e tranquila. De qualquer forma, é algo que indico às jovens urologistas”, pontua.
Minoria em uma das maiores
De uma geração mais jovem, a mineira Bárbara Drumond, que este ano conclui a residência em Ortopedia e Traumatologia no Hospital Municipal Lourenço Jorge, no Rio de Janeiro, compartilha da mesma visão das colegas. “O caminho é um só: muito estudo e dedicação. Se você se tornar uma boa profissional, a barreira dos gêneros será transposta”, acredita.
Em seu caso, Bárbara está inserida no contexto curioso da Ortopedia, que é a sétima entre as maiores especialidades do país, mas é uma nas quais as mulheres têm menos espaço. Ela conta que vivenciou situações difíceis: “Não raro, as pessoas nos julgam frágeis, fracas, e incapazes de realizar diversos procedimentos. Isso não vem apenas dos colegas profissionais. Os próprios pacientes, às vezes, ‘preferem’ um atendimento realizado por um homem.”, conta.
Apesar dessa realidade, Bárbara revela que nunca desistiu da especialidade. “Não me paralisa. Com educação e um bom serviço, aos poucos vamos quebrando essas barreiras e conquistando nosso espaço. Felizmente, essa é uma estatística, que vem reduzindo com o passar dos anos, e a partir do momento em que você toma essa decisão – de qual especialidade seguir – você não pode focar nas dificuldades”, defende.
Força e esperança
O aumento da presença feminina em áreas de maioria masculina é um movimento que pode ser percebido em diversos setores da sociedade já há alguns anos – e deve ser celebrado. Na trajetória de Tatiana, por exemplo, ser mulher em um contexto predominantemente masculino nunca foi problema. “Fui muito bem recebida em todos os serviços de Neurocirurgia por onde passei: como acadêmica, como residente, quando estava me especializando e como fellow em um serviço internacional. Sempre fui tratada com igualdade pelos meus pares”, garante.
Já para Miriam, na Urologia, algumas situações desconfortáveis aconteceram: “Uma ou outra vez lembro de pacientes que falaram abertamente que não seriam operados por uma mulher, que procurariam um urologista homem. Hoje, cada vez mais raramente escuto essas manifestações”, ressalta. Já Bárbara acrescenta que, apesar das barreiras, felizmente, não foi apenas isso que encontrou. “Em contrapartida, tive excelentes mestres que se tornaram amigos e sempre me incentivaram das diversas formas a crescer e a amadurecer, na esfera pessoal e profissional”, relembra.
O cenário para as mulheres na Medicina, hoje, é de bastante esperança. Elas conquistam cada vez mais espaço, com “olhar mais humanizado, acolhedor”, segundo Bárbara, e têm mostrado aos colegas e pacientes que um serviço de qualidade independe de gênero.
Nas palavras de Tatiana: “Mulheres são muito responsáveis. Homens também. Mulheres são muito dedicadas. Homens também. Não podemos generalizar, seria injusto. Seres humanos responsáveis e dedicados trazem qualidade à Neurocirurgia”. Como vemos nos exemplos das outras médicas, essa contribuição também está presente nas demais especialidades.
Incentivo para as futuras ortopedistas, urologistas ou neurocirurgiãs
“Se você realmente deseja cursar a Ortopedia, que se dedique muito e estude, porque é uma especialidade encantadora. O caminho é longo, mas vale a pena”.
Bárbara Drumond
“Se a escolha for a Neurocirurgia, vá em frente. Estude muito! Não coloque esse obstáculo relacionado ao gênero. A melhor forma é estudar e mostrar resultados. Essa fórmula sempre funcionou para todos”.
Tatiana Protzenko
“Siga em frente! Hoje temos várias lideranças femininas na área da Saúde, que estão abrindo caminhos, criando oportunidades e deixando o mercado mais competitivo. Podemos seguir em frente de acordo com nossa vocação, nosso amor à profissão e nossa afinidade com esta ou aquela área”.
Miriam Dambros