O descredenciamento é um assunto que pode assustar muitos médicos empreendedores e, até mesmo, grandes conglomerados de Saúde. Ficar desamparado de sua maior operadora ou, em alguns casos, da única fonte de renda é algo que pode desestabilizar qualquer gestor. Por isso, é preciso pensar no que fazer para evitar essa ocorrência ou em como se proteger da “surpresa”.
Desde que a lei 9.656/98 entrou em vigor, as operadoras de saúde podem quebrar os contratos com consultórios, clínicas, hospitais e laboratórios de maneira unilateral – inclusive essa é uma das cláusulas de contrato. Em relação aos consultórios, geralmente há – para os médicos – um aviso prévio que comunica o descredenciamento. O aviso é feito de 30 a 90 dias antes da finalização da parceria. Já no caso de clínicas e hospitais com maior porte, a operadora deve credenciar outro estabelecimento médico equivalente para suprir as necessidades da população naquele local.
Por que ocorre o descredenciamento?
Parte da quebra desses contratos acontece devido a motivações éticas ou pelo não seguimento das diretrizes determinadas pelas sociedades médicas em diagnósticos ou tratamentos. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) aponta que as operadoras removem da lista de médicos credenciados – mesmo sem desvinculá-los – aqueles que costumam solicitar mais exames que o exigido dentro da normalidade, o que reduz de modo significativo a demanda daquele profissional. Apesar disso, o órgão declara que a justificativa oficial está concentrada em fatores administrativos.
Além disso, segundo João Fernandes, consultor de Defesa Profissional em Oftalmologia, há dois fatores que estão diretamente atrelados ao aumento dos descredenciamentos: a verticalização dos atendimentos pela operadora e novas formas de remuneração. O primeiro trata-se da concentração dos serviços médicos em uma única instituição da operadora de saúde e, a partir dessa inciativa, exames, consultas e afins são realizados em uma única localidade, não havendo necessidade de manter outras instituições credenciadas.
Além disso, formas de remuneração como o capitation, em que a instituição recebe um valor fixo por mês independentemente da quantidade de atendimentos realizados, surgem como mecanismos para reduzir os custos. “A operadora paga um valor fixo e, para que o serviço tenha retorno financeiro, ele não pode fazer tudo que há de ser realizado, pois senão terá prejuízo. Quem sai perdendo é o paciente”, alerta Fernandes.
O que fazer então?
Quando ocorre o descredenciamento unilateral, de acordo com o especialista, os médicos não devem buscar vias jurídicas para tentar reverter a situação, pois o direito de realizá-lo é uma das cláusulas de contrato. Dessa forma, as operadoras sempre estarão em conformidade com a lei e tal situação apenas gerará desgastes para ambas as partes. Assim, é importante adotar algumas atitudes que visem a reduzir os impactos gerados por um descredenciamento, como listamos a seguir.
É de suma importância que os pacientes não sejam pegos de surpresa após a realização de uma consulta. Porém, antes de comunicá-los, é importante traçar alguma estratégia para manter o interesse de tal público. Devemos ter em mente que esses pacientes já pagam mensalmente um plano de saúde e não desejam ter mais gastos, por isso é importante pensar em mecanismos que amenizem o custo da consulta. Nesse contexto, há duas possibilidades: transformá-los em clientes particulares – talvez com a adoção de preços mais baixos – ou orientá-los a respeito de reembolsos.
O paciente deve se sentir confortável e confiante com o serviço prestado pelo médico. Além disso, também é importante preservar a qualidade do relacionamento com aqueles que não se consultam mais, uma vez que eles podem retornar – seja por um eventual recredenciamento ou por vias particulares. Já ficou comprovado que clientes satisfeitos costumam voltar e se fidelizar com mais frequência.
Para não ser pego de surpresa pelo descredenciamento de um grande plano de saúde, é importante não concentrar os atendimentos em uma única operadora. Ao diversificar, você pode contornar situações como esta com mais facilidade, já que haverá outras fontes de renda.
Depoimento
Como foi passar por um descredenciamento?
“Há cerca de um ano recebemos uma carta de descredenciamento de uma grande seguradora de saúde. Prestávamos atendimento a essa entidade por cerca de 25 anos e ela representava para nós o terceiro lugar em número de atendimentos, o equivalente a 18% do nosso faturamento.
Como clínica de assistência pediátrica, pensamos em como daríamos seguimento ao tratamento daquelas crianças e suporte aos seus responsáveis, visto que tínhamos pacientes com patologias crônicas e neuropatias irreversíveis, entre outras, que utilizavam nosso serviço ambulatorial e emergencial desde o nascimento. Em um momento deste, históricos, prontuários, confiança e segurança ficam extremamente abalados, repercutindo mais nos menos favorecidos e nos mais necessitados.
Retornando para a parte comercial da empresa, procuramos rever todos os contratos, desde atrasos e correções nos reajustes, relações de parceria e segurança bilateral, avaliando o peso que cada um poderia provocar em nosso faturamento; procurando mais parceiros, com um peso menor no volume de cada um destes; e valorizando o nosso produto, visto que o atendimento pediátrico e de subespecialidades pediátricas está cada vez mais carente nos dias atuais.
Adotamos uma consulta com um valor próximo ao que a seguradora reembolsaria o usuário. Com isso, minimizados nossas perdas, conseguindo manter cerca de 65% desses pacientes. A nossa equipe de marketing divulgou nas nossas redes sociais o ocorrido e a nossa proposta para reembolso. Além disso, aumentamos o número de atendentes da central para solucionar todas as dúvidas”.
Antonio Carlos Turner, pediatra e diretor da Total Kids
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