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Prontuário médico: um desafio para guardar, um dilema para descartar

Por:

Karin Dracxler

- 20/12/2022

Documento essencial para registrar o acompanhamento do paciente, o prontuário médico gera um grande desafio para o seu armazenamento. A legislação permite o descarte, mas especialistas chegam a orientar que isso nunca seja feito

O prontuário faz parte do dia a dia do médico, sendo uma das principais responsabilidades do profissional a guarda desse documento, o que pode ser um verdadeiro desafio. Afinal, é preciso ter um espaço físico grande o suficiente para o armazenamento dos prontuários ao longo de vários anos. Nesta matéria, mostramos como esse desafio pode dar uma dor de cabeça ao médico e como pode ser resolvido.

O tempo de guarda dos prontuários antes de 2007 era previsto em diversas legislações, que traziam prazos distintos. A partir da resolução 1.821/2007 do Conselho Federal de Medicina (CFM), ficou estabelecido que os prontuários médicos devem ser armazenados pelo período mínimo de 20 anos.

Segundo a pediatra Maria Kokkinovrachos, coordenadora médica do Setor de Internação do Centro Pediátrico da Lagoa, no Rio de Janeiro, os desafios das instituições são a locação e a conservação desses prontuários em papel guardados por 20 anos. “O espaço físico dos hospitais não suporta esse volume. A ideia então, é um espaço intra-hospitalar que arquive os prontuários por até cinco anos e um espaço externo maior para o arquivamento do restante de prontuários, que ultrapassam o tempo de cinco anos”, explica.

O local de armazenamento deve:

  • Ser arejado;
  • Estar livre de exposição solar frequente;
  • Evitar a deterioração do papel por umidade, calor ou poeira;
  • Manter a qualidade dos documentos;
  • Preservar as informações contidas nos prontuários.

Segurança da guarda

Normalmente, o prontuário é arquivado sob a guarda de instituições de saúde, tendo elas a responsabilidade sobre a segurança das informações. O prontuário médico engloba grande quantidade de dados sensíveis sobre os pacientes.  Além de ficar atento ao prazo de, no mínimo, 20 anos de guarda, o advogado Alexandre Martins, professor e consultor jurídico que hoje atua no Brasil e em Portugal, alerta: “O Código de Defesa do Consumidor delimita um prazo de cinco anos para que o consumidor, no caso o paciente ou um familiar, possa ingressar com uma ação de indenização. Porém, tal prazo somente tem início quando o mesmo toma conhecimento da existência do dano ou de quem seja o responsável”.

Outro ponto importante: quando ocorre a suspeita de erro médico, autoridades como a Polícia, a Justiça e o CFM podem utilizar o prontuário para verificar se houve, de fato, imprudência, imperícia ou negligência. “O prontuário, mais do que um guia de consulta rápida do médico, é acima de tudo um documento do paciente, que pode ser usado em futuras ações contra terceiros, bem como para o reconhecimento de cadáveres, laudos para aposentadoria, investigação de fraudes contra seguradoras ou mesmo ações contra o próprio médico. Por isso, o médico deve escrever tudo de forma clara, para que um leigo entenda o seu conteúdo, se um dia for necessário”, orienta Martins.

Resolução CFM 1.821/2007:

  • Aborda as normas técnicas relacionadas à digitalização e ao uso dos sistemas informatizados para a guarda e o manuseio dos documentos dos prontuários dos pacientes;
  • Autoriza a eliminação de documentos em papel;
  • Permite a troca de informação identificada em saúde.

Prontuários eletrônicos

A realidade de guarda dos prontuários em papel está mudando devido às novas tecnologias, que fornecem ferramentas e plataformas avançadas, permitindo o armazenamento dos dados de forma digital por meio dos prontuários eletrônicos. Mas será que essa versão pode substituir o documento em papel?

“A transição para o prontuário eletrônico deve ser feita gradualmente. A transferência das informações para um meio digital demanda um período de adaptação e está autorizada, desde que os métodos de digitalização reproduzam todas as informações dos documentos originais”, explica Maria Kokkinovrachos.

A pediatra completa: “É preciso escolher um software que forneça garantia de segurança (por exemplo: controle de acesso, adequação às leis, principalmente a Lei de Proteção Geral de Dados – LPGD, protocolos de segurança contra vazamento de dados etc.), que atenda às necessidades da instituição e do paciente, que esteja integrado a uma prescrição eletrônica e que obedeça aos requisitos de Nível de Garantia de Segurança 2 (NGS2), conforme o Manual de Certificação para Sistemas de Registro Eletrônico de Saúde”.

Dados sensíveis e LGPD

Cada vez mais médicos e instituições de saúde vêm adotando os prontuários eletrônicos. No entanto, é preciso ter atenção ao que diz a legislação atual sobre os chamados dados sensíveis. A LGPD corrobora com a preocupação na proteção dos dados íntimos dos pacientes, determinando padrões de segurança para a captação de dados, principalmente com relação aos dados considerados sensíveis, como é o caso dos prontuários.

Essa lei, que entrou em vigor em 2020, também passou a penalizar o vazamento de dados pessoais sensíveis. “Essa conduta fere os direitos e garantias previstos pela Constituição Federal, podendo gerar para os responsáveis pelo vazamento responsabilidades cíveis, como pagamento de indenizações, e penais, bem como éticas perante o Conselho Regional de Medicina”, afirma Alexandre Martins.

A LGPD é bem rigorosa com relação ao descarte de dados sensíveis, principalmente sobre a saúde da pessoa, mas não só isso: o Código de Ética Médica também aconselha a manutenção do sigilo, diante da obrigação do segredo profissional que recai sobre o médico. Na visão do advogado, os prontuários antigos merecem mesmo serem armazenados e nunca descartados.

Caso seja necessária a eliminação de prontuários médicos, que procedimentos devem ser seguidos? Maria orienta: “Por se tratar de documentos confidenciais, o ideal é que esse descarte seja realizado com trituração e incineração, evitando, dessa forma, qualquer possibilidade de vazamento dos dados sensíveis que compõem o prontuário”.

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