As mídias vivem, hoje, uma crise de reputação. Tudo que é exibido e publicado tem sido contestado. Não é por menos que vemos seguidos protestos em frente aos conglomerados de comunicação, como a Rede Globo ou a Editora Abril. “O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo” ou “Veja mente”, em alusão à campanha publicitária da própria revista, são frases escritas em faixas nos recentes protestos de rua.
E as manifestações contrárias não se resumem aos grandes veículos. Regionalmente, isso também ocorre, assim como em outros países. Mas o que houve com a credibilidade dos tradicionais veículos de comunicação? Eles passaram a agir com menos independência, tão necessária para o jornalismo? Acredito que a independência seja maior hoje do que há 10 ou 20 anos, mas o que mudou foi o poder do cidadão comum, que passou a ter voz própria.
As mídias sociais deram um megafone para cada cidadão, que expressa sua opinião para tudo, seja na política, na economia, no futebol e em tantas outras áreas. O poder está a um click e, parodiando Glauber Rocha, “basta uma ideia na cabeça e uma postagem no Facebook”. Os grandes conglomerados de comunicação perderam o status daquela “aldeia global” das décadas de 1970 e 1980, quando ditavam a verdade absoluta sobre os acontecimentos e falavam para o Brasil inteiro.
Hoje a comunicação, de fato, está em nossa “aldeia local”, em nossa rede de relacionamentos, em nosso grupo nas mídias sociais, independente de qual seja: Facebook, Twitter, Mobli, Snapchat, WhatsApp, Linkedin etc. Esses microcosmos alinhados definem o pensamento coletivo, mas não de todos, de certas coletividades. Somos várias alcateias, inúmeras, milhares. O movimento é de baixo para cima e não ao contrário, como foi até pouco tempo.
A mudança está em nossas casas. Lembro de uma frase do genial Mario Quintana que, sempre lúcido, enxergava além de seu tempo. Quintana escreveu: “quando guri, eu tinha de me calar à mesa. Só as pessoas grandes falavam. Agora, depois de adulto, tenho de ficar calado para as crianças falarem”. Com a democratização do conhecimento, as crianças e os adolescentes ensinam tanto a seus pais e professores, como são ensinadas. A troca é muito mais intensa do que era no passado.
Os adultos, assim como os tradicionais veículos de comunicação, não são mais os detentores da verdade, que está em cada esquina, dentro de cada um de nós. E cada um, independente da idade, aliás, quanto mais jovem, mais ágil na comunicação, com seu poder de propagar a própria verdade, de sua própria forma e da maneira que considerar mais adequada. É evidente que, muitas vezes, nos assustamos com a repercussão. Um simples desabafo pode viralizar, tornar-se um grito de guerra e provocar as mais diversas reações.
Em segundos, um cidadão comum pode se “transformar” na Rede Globo ou na Veja e ver seu próprio Facebook dividido entre aqueles que concordam com sua verdade e aqueles que radicalmente discordam e protestam, com a mesma virulência que criticariam o poderoso conglomerado de comunicação. Nesse momento, você passa a ser o inimigo a ser abatido, sem dó nem piedade. Detentor da verdade que incomoda.
Em tempos de crise de reputação, em que a dúvida impera sobre tudo e sobre todos, penso no milenar provérbio chinês que fala das três verdades da vida: a minha, a sua e a verdade. E mesmo com uma simples ideia na cabeça e uma postagem no Facebook, devemos, ainda, nos lembrar de que as inovações são milhares e constantes, mas nossos corações são os mesmos.