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Quando a relação médico-paciente vai além

Por:

Nayara Simões

- 01/05/2020

Atualmente, construir uma boa relação médico-paciente é fundamental para o sucesso do atendimento. Porém, qual seria a melhor maneira de exercitá-la? Há vários quesitos importantes na construção desse relacionamento, porém, há situações em que é possível ir além. O médico americano SD Madduri conta um desses casos, em que foi além. Sem saber, ele realizou o último pedido de seu paciente. A seguir, leia um resumo do relato do profissional e saiba como uma inesperada doença uniu uma família.

“Após analisar os exames que tinha em mãos, precisei, infelizmente, dar a má notícia ao meu paciente. ‘Howard (nome fictício), devo lhe informar que o senhor possui câncer de rim. O melhor tratamento é removê-lo cirurgicamente’. Examinei seu rosto procurando uma reação. Fiquei na dúvida se ele havia entendido a gravidade da situação e perguntei se algum parente o aguardava do lado de fora do consultório. Ele foi enfático ao dizer que estava só.

Na semana seguinte, a cirurgia ocorreu muito bem e não havia incidência de metástase nos linfonodos. A perda sanguínea foi mínima e ele tolerou bem o procedimento. Após a cirurgia, perguntei à enfermeira quem estava acompanhando Howard no hospital. Ela me informou que não havia visto nenhum parente dele. Nesse momento, fiquei surpreso ao saber que não havia ninguém ao seu lado durante uma cirurgia tão delicada. Procurei o seu prontuário e encontrei um número de emergência. Ele tinha uma filha, porém ela se encontrava há quase 250 quilômetros de distância do hospital.

Na manhã seguinte, fui ver o meu paciente. Ele estava ótimo, só que, mais uma vez, sua filha não estava lá. Eu continuava sem entender o porquê de ela estar ausente. Foi então que tomei coragem. ‘Howard, não vejo sua filha. Onde ela está?’ Ele contou sua história: ‘Há alguns anos, preparava uma viagem com uns amigos quando minha esposa adoeceu. Ela me disse que ficaria bem e insistiu para que eu viajasse. Quando retornei, encontrei minha esposa morta na cama. Fiquei devastado e minha filha me culpou pela morte de sua mãe. Desde então, ela se recusa a me ver ou a falar comigo’. Fiquei péssimo pela história e por saber que sua filha não estaria presente no momento em que seu pai mais precisava dela.

No dia seguinte, fui ao hospital e liguei para a filha de Howard. Apresentei-me e expliquei toda a situação. Disse que seu pai estava bem, mas que precisava de alguém ao seu lado nesse momento. Após alguns segundos de silêncio, ela disse: ‘Estarei aí, doutor. Vou ver o meu pai’. Horas depois, ao entrar no quarto de Howard, vejo uma moça ao seu lado, Lisa (nome fictício), sua filha. Encontro também um renovado Howard, mais sorridente e com uma nova vida no rosto. ‘Obrigado por tudo, doutor. Ter minha filha de volta na minha vida foi o que de melhor me aconteceu. Não sei como posso lhe agradecer’. Howard, então, voltou para casa em boa companhia e tudo corria muito bem.

Após alguns dias, porém, ao chegar para mais um dia de trabalho no hospital, a enfermeira me informou que Howard havia dado entrada no hospital. Ele estava se sentindo fraco e apresentava desmaios, até que, infelizmente, teve uma parada cardíaca. A equipe fez de tudo para reanimá- lo, mas ele foi declarado morto.

Fui até a sala de espera e comuniquei a notícia para Lisa. Ao mesmo tempo em que falava, lágrimas escorriam pelo rosto da moça. Após uma longa pausa, ela disse: ‘Sabe, doutor, meu pai estava tão feliz por me ter de volta em sua vida. Era o que ele mais queria. Meu pai teve seu último pedido atendido’”.