Estava almoçando no refeitório do hospital quando meus ouvidos mal educados captaram a conversa entre dois residentes na mesa ao lado. Como os conhecia e a conversa me interessou, não resisti a participar da discussão. Eles estavam no último mês da residência médica e falavam sobre as suas dúvidas para se inserirem no mercado de trabalho. Mostravam principalmente seu desejo em começar uma prática de consultório, mas sequer imaginavam como fazê-la. Dúvidas sobre carreira e gerenciamento do espaço físico, sobre a relação que deveria ter com a secretária desse futuro consultório e como buscariam ingressar no universo das operadoras de saúde. Ou mesmo se deveriam ou não investir nesse sonho.
Essa conversa me levou a lembranças de tantas outras que já tive sobre o assunto. Uma dúvida que começa já na faculdade de Medicina quando o futuro médico não recebe qualquer informação sobre o gerenciamento de sua carreira médica. Somos treinados na identificação de sinais e sintomas – e isso é bárbaro, pois poucas práticas são tão prazerosas e fundamentais como a Semiologia –, mas onde ficam os ensinamentos para o gerenciamento de um dia a dia que nos suscita outros tipos de dúvidas da carreira, como os apresentados por meus jovens colegas na conversa do refeitório? Uma inadequação curricular que começa a ser revertida, mas que ainda precisa de muitas correções.
Qualidade na recepção
Devemos saber e compreender a importância da qualidade na recepção. Como é fundamental um treinamento para secretárias, pois são um importantíssimo cartão de visitas desse profissional antes mesmo de ele ter contato com o paciente. E a escolha do consultório? Começa por uma pesquisa sobre o local para instalá-lo e passa por várias informações preciosas, como características do ambiente e adequação à especialidade do médico. O material que o profissional disponibiliza aos pacientes, a credibilidade que sua postura e aparência imprimem ao que ele diz, a pontualidade, a clareza na tradução de nosso jargão profissional a uma informação que o paciente possa entender; enfim, muitas informações que mereceriam ser aprendidas da mesma forma que aprendemos sobre patologias, diagnósticos e tratamentos.
Certamente que as adequações curriculares, assim como as pós-graduações como MBAs em Saúde, vêm tentando corrigir essas falhas, mas teremos um longo caminho pela frente. Não há porque achar que conceitos como a aplicação do marketing à saúde são violações aos conceitos mais nobres da Medicina. Quando valorizamos todos esses aspectos, estamos valorizando a relação médico-paciente, o pilar fundamental de nossa profissão. Ter atenção com o paciente, respeitá-lo em sua individualidade, buscar ferramentas que agreguem mais valor ao seu atendimento e criar um vínculo que permita transferência nessa relação e consequente mais adesão ao tratamento proposto nada mais são do que ações de marketing que fazemos involuntariamente e que nos aproximam de um atendimento de excelência em nossa profissão.
Portanto, façamos do conceito de mudança um aliado e comecemos a reinventar um perfil mais antenado com o momento que vivemos para a nossa relação médico-paciente. Os conceitos novos, em uma era digital, podem ser humanizados e a humanização pode ser mais arrojada, com uma alma mais de vanguarda. As diferenças cabem em nós e as novidades nos conciliam quando nossas cabeças assim permitem.
Clique aqui e acesso o artigo com a metáfora “entre a ponta da agulha e o pênalti”.