Hoje, muitos médicos ainda acreditam que atendimento no consultório refere-se apenas àquele que acontece da porta para dentro da sua sala, com o paciente sentado à frente da sua mesa. No entanto, sabemos que isso não é verdade. Cada vez mais, fala-se em jornada do paciente, em experiência do cliente em tudo aquilo que ele perceba ser diferenciado no contexto do trabalho do médico. Fazer com que o paciente perceba a qualidade do atendimento é muito importante e uma grande parte disso está “nas mãos” das secretárias.
A recepção é um dos principais locais de um consultório ou clínica, pois é onde o paciente tem o primeiro contato com a equipe de profissionais que irá recebê-lo, desde a chegada para a consulta até o pós-atendimento. A secretária ou recepcionista desempenha um papel fundamental nesse setor, sendo responsável por fazer o atendimento do paciente da melhor forma possível e garantir a organização do trabalho. Portanto, a atuação dessa profissional é indispensável para que a clínica ou o consultório tenha um alto padrão de qualidade.
Para Marcia Campiolo, psicóloga especializada em Recursos Humanos e Gestão na área da Saúde, no que se refere à qualidade do atendimento, é possível que a equipe aprenda e receba informações sobre o tema. Mas, quando se fala de aprendizagem em qualidade, é preciso entendê-la como um processo continuado. Não é possível pensar que apenas em um curso, com algumas orientações, a secretária estará preparada para realizar um atendimento com qualidade.
– O tempo todo, estamos aprendendo e nos surpreendendo com os pacientes, com os fatos que vão acontecendo. Isso nos mostra que precisamos continuadamente nos reciclar cada vez mais. Existem coisas que não se ensina. Por exemplo, algumas pessoas têm um perfil melhor para o atendimento ao cliente, têm características que dificilmente poderemos ensinar para outras, mas há técnicas, como forma de atender e de se portar, e isso pode perfeitamente ser ensinado. Acredito no aprendizado constante e no desenvolvimento de habilidades na equipe – enfatizou.
No dia a dia, o médico tem vários compromissos, além do consultório, e muitas vezes ainda trabalha em hospital. No meio disso tudo, acompanhar o que está acontecendo na recepção da clínica, não é uma tarefa fácil. Fazer esse acompanhamento exige bastante foco, mas o médico precisa estar antenado com o que está acontecendo hoje no mercado e mostrar o diferencial do seu atendimento.
De acordo com Marcia Campiolo, a principal dificuldade do médico, para estabelecer o foco na qualidade do atendimento ao paciente, é não conseguir dimensionar o que esse investimento vai trazer de retorno para ele. O médico, formado para atender os problemas de saúde, não tem o preparo necessário para compreender a importância de investir na qualidade do trabalho da secretária para o seu sucesso profissional.
– Precisamos entender que o cliente do médico não é apenas o paciente. A definição de cliente dentro de um serviço médico precisa ser um pouco mais ampla. Muitas vezes, o problema acontece com o acompanhante do paciente, que foi quem teve a percepção ruim do atendimento. A qualidade precisa permear os vários tipos de cliente. O atendimento da secretária é uma área muito negligenciada no consultório. Recentemente, fui a dois médicos, de especialidades diferentes, para consulta de rotina. O atendimento da recepção não estava bom e a sensação que tive foi que aquelas clínicas estavam decadentes e mal cuidadas – comentou.
Na maioria das vezes, o médico não se dá conta da importância da qualidade do atendimento na recepção e que é preciso se preocupar com detalhes que vão além da formação técnica.
Marcia Campiolo tem um convívio intenso no meio médico. Além de ser gestora de um serviço de Oftalmologia, a família é de médicos: o marido, os dois filhos, o único sobrinho, além dos sete sobrinhos do marido. A especialista afirma que, em geral, o médico vive em uma zona de conforto muito perigosa, uma vez que somente uma pequena parte dos pacientes dá algum tipo de feedback em relação ao atendimento recebido, enquanto que a maior parte não dá esse feedback e o médico “fica dentro de uma bolha” achando que está tudo bem.
– Para o médico, não é fácil entender o que está acontecendo com a sua clínica, pois ele precisa trabalhar, atender os pacientes. Então, o que chega até ele é uma pequena parcela, muito pouco do que acontece. No caso do meu serviço médico, percebo que o profissional jovem tem um melhor entendimento da importância da qualidade no atendimento. Quando há alguma reclamação na ouvidoria, o jovem se importa mais, tenta resolver, não quer que o problema se repita. Enquanto que o médico mais experiente, muitas vezes, se surpreende com as reclamações e fala: “não acredito que estão reclamando disso, não é possível” – relatou.
O feedback em relação ao atendimento é muito importante e, por isso, é preciso criar oportunidade para que as secretárias possam contribuir para o aperfeiçoamento desse trabalho. O tempo é curto e o dia a dia é corrido, mas Marcia Campiolo dá uma dica para que isso seja possível.
– Independentemente do tamanho e da estrutura do consultório, é essencial ter um tempo, pelo menos uma vez por mês, para conversar com a equipe durante uma ou duas horas, para que ela diga o que está acontecendo na recepção. É fundamental pedir para que se faça o registro dos feedbacks para que, na hora da reunião, eles estejam ali devidamente anotados para que possam ser abordados. Se for possível, seria interessante ter algum mecanismo para que o paciente possa dar o seu retorno sobre o atendimento, por WhatsApp ou até por uma caixa de sugestões, desde que ele receba a devida resposta a sua demanda. Isso não pode ser feito se a reclamação se perder ou se não houver resposta. É importante que o paciente possa expor o parecer dele em relação ao atendimento recebido, porque o retorno pode surpreender o médico e mostrar que a situação é diferente do que ele pensava. Se o médico tirar um tempinho para entender o que está acontecendo e tomar medidas, vai ajudar bastante fazer com que ele entenda melhor o seu negócio e possa oferecer um atendimento de qualidade – explicou a gestora.