O WhatsApp é o aplicativo de mensagens instantâneas mais popular no Brasil, com uma estimativa de que 120 milhões de brasileiros tenham uma conta. 96% das pessoas que têm acesso a um smartphone usam o aplicativo como seu principal método de comunicação. Diante dessa realidade, o WhatsApp é usado para manter contato com amigos, familiares, colegas de trabalho e, claro, com os médicos. Antes mesmo da pandemia de Covid-19, o aplicativo já era muito usado para todo tipo de orientação dos médicos para os pacientes. Com a necessidade de isolamento social e o advento da telemedicina, o uso da tecnologia e do aplicativo de mensagens se tornou fundamental.
Até pouco tempo, era normal mães ligarem para os pediatras para receberem orientações sobre uma situação de emergência, como uma febre que não baixava. Com o uso do WhatsApp, essas “consultas” tornaram-se bastante frequentes e nem sempre numa situação de emergência e sim mais cotidiana. Mães passaram a perguntar sobre doses de medicações, enviar fotos de hematomas e escoriações, fazer vídeos mostrando o comportamento das crianças, tirar dúvidas sobre alimentação, questionar se devem ir ao pronto-socorro ou agendar uma consulta de urgência. Os pediatras concordam que o uso do WhatsApp é uma realidade sem retorno e que ajuda para informações rápidas. O que preocupa os especialistas são aquelas mães que querem fazer uma consulta pelo aplicativo, uma vez que trocas de mensagens são insuficientes para fazer um diagnóstico e que ainda podem, inclusive, ter interpretações erradas.
Para Guilherme Sargentelli, pediatra e Coordenador Médico do Universo DOC, de fato, em um passado extremamente recente, o cenário do atendimento pediátrico era representado basicamente pelo binômio contato telefônico x consulta presencial. Ou seja, em um primeiro instante, os familiares recorriam ao contato telefônico para tirarem dúvidas de complexidade clínica aparentemente menor ou para triarem, junto ao profissional, a necessidade ou não de uma consulta presencial. A consulta era necessária dentro da prioridade emergencial ou não do caso, ficava definido entre família e profissional o melhor agendamento para realizá-la.
– Avançando para nosso momento atual, a primeira consideração que faço é que a tecnologia pode, e deve, ser aliada do paciente/família e do pediatra. O que antes era reportado ao pediatra pelo contato telefônico pode seguramente ser reportado pelo WhatsApp. Mensagens curtas, com dúvidas associadas às condições do dia a dia que suscitem mais uma curiosidade do que ansiedade nos familiares, podem ser encaminhadas pelo aplicativo com uma boa margem de segurança para ambas as partes. Até porque, em muitos casos, pequenos vídeos com imagens podem ajudar na assertividade da orientação médica – avaliou o especialista.
De acordo com Guilherme Sargentelli, a recorrência de sintomas ou a não solução para as dúvidas iniciais apresentadas pela família através do WhatsApp podem ser pontos de fundamentação decisória para transformação de uma dúvida em consulta on-line.
– Em um contexto no qual ocorra a manutenção da queixa clínica que originou o contato sem uma boa resolução do caso ou que, logo ao primeiro contato, o médico perceba sugerir um quadro clínico de maior investigação, fica a proposta para esse ser o “divisor de águas” para gerar uma consulta, seja ela on-line ou presencial, com respeito aos protocolos de segurança atualmente impostos pela pandemia – ressaltou.
– Ainda entendo, continuou Sargentelli, que aquela dúvida que não consegue ser sanada pelo pediatra de forma clara, concisa e rápida, e que necessite de um rol maior de perguntas por parte do profissional para entender o quadro clínico, possa gerar uma consulta. Inclusive, essa construção de raciocínio pode ser uma argumentação/explicação do pediatra frente à família para mostrar a pertinência de se promover a consulta on-line. Além disso, essa formatação de critérios também guarda relevância para justificar um ponto sempre culturalmente desafiador da consulta não presencial que é a cobrança de honorários.
Em 2017, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou o Parecer nº 14/2017, sobre o uso do aplicativo WhatsApp. Segundo o Conselho, “está claro que o médico pode receber mensagens no WhatsApp e responder, como sempre fez, atendendo telefonemas de pais aflitos com o filho pequeno, cuja febre não baixava e precisava ouvir o pediatra com recomendações seguras e tranquilizadoras. Todos os regramentos dizem respeito a não substituir as consultas presenciais ou aquelas para complementação diagnóstica ou evolutiva, a critério do médico, pela troca de informações à distância”.
Como o parecer foi publicado antes da pandemia de Covid-19, o texto refere-se apenas à consulta presencial.