A relação médico-paciente é repleta de momentos de tomadas de decisão, principalmente no que se refere aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos a ser adotados. Nessas horas, quem tem o poder da decisão: o médico, profissional preparado para cuidar de nossa saúde, ou o paciente, dono de seu corpo e da própria vida?
Junto a essa questão está a discussão bioética sobre a postura do médico quanto ao esclarecimento do paciente. Este precisa saber detalhes sobre diagnósticos, prognósticos e terapêuticas? Para isso existe o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), um instrumento que apresenta as devidas orientações e esclarecimentos que foram prestados aos clientes e/ou responsáveis (no caso de pacientes pediátricos e idosos em determinadas situações).
Trata-se da oportunidade de sanar as possíveis dúvidas existentes sobre o tratamento proposto e procedimentos a serem realizados, portanto, aproxima e resulta em maior confiabilidade à relação médico-paciente, uma vez que esclarece com transparência as possíveis intercorrências, riscos e benefícios da assistência prestada.
Proteção jurídica
Além do ponto de vista de esclarecimento ao paciente, para o médico o documento também tem grande valor no que diz respeito à proteção dos profissionais em relação a possíveis ações ou processos judiciais. Com a assinatura do Termo de Consentimento, o paciente declara que está de acordo com o procedimento (mesmo que efeitos não desejados, mas previamente esclarecidos pelo médico aconteçam). Por isso, há responsabilidade de ambas as partes na escolha do tratamento/procedimento.
Alexandre Martins, especialista em direito médico, reforça que o TCLE é uma exigência tanto do Código de Ética Médica como também do Código de Defesa do Consumidor, logo, o médico não tem opção de fazer ou não, pois é uma imposição legal.
“O documento deve ser guardado assim como o prontuário médico. A questão do prazo, eu sugiro que guarde para sempre, uma vez que o prazo para propor uma ação de responsabilidade civil contra o médico é de cinco anos contados não da realização do ato médico, mas do conhecimento do fato pelo paciente. Vale dizer, um procedimento realizado hoje, que gera um dano, que o paciente só descobre daqui a dez anos, terá o paciente mais cinco anos para propor a ação, ou seja, 15 anos após o fato”, sustenta.
Ainda do ponto de vista jurídico, é muito importante que o Termo de Consentimento seja personalizado caso a caso, de acordo com o tipo de procedimento a ser realizado. Dessa forma, essa personalização garante um caráter individual das informações passadas, garantindo maior robustez jurídica e tranquilidade ao médico.
Para entender um pouco mais sobre o preenchimento do documento, conversamos também com a enfermeira do Serviço de Educação Permanente do Grupo Prontobaby, Laís Pisani, sobre o uso do TCLE na prática e preparamos algumas dicas para auxiliá-lo nesse processo. Confira a seguir:
1- Defina o modelo do documento
Utilizar um termo padrão ou modelos diferentes depende do conteúdo elaborado. O documento pode conter todas as informações pertinentes em um único padrão ou pode ser personalizado de acordo com cada área ou especialidade da assistência. “Em nossa instituição temos vários modelos, pois achamos que seria mais adequado. Há um para os procedimentos cirúrgicos, outro para os anestésicos, um diferente para hemotransfusões, para remoção e assim por diante. Ao todo, temos 20 formulários, incluindo os administrativos”, esclarece Laís.
2- Oriente seus pacientes
Os profissionais de saúde devem oferecer todas as orientações sobre os cuidados a serem prestados. A comunicação efetiva com o paciente é essencial nesse processo. “Não se deve apenas pedir para que o indivíduo ou seu responsável assine um papel para cumprir as exigências da instituição”, pontua.
3- Verifique o preenchimento do documento
É responsabilidade da equipe multidisciplinar exigir que o documento esteja corretamente preenchido e completo, em todos os prontuários. “Verificamos regularmente se os referidos termos estão adequados e se estão presentes em todos os formulários. Desse modo, caso não estejam, entramos em contato com as equipes e/ou os responsáveis para viabilizar as providências e referidas assinaturas”, relata a enfermeira.
4- Redija o termo corretamente
O termo deve ser escrito com o mais absoluto cuidado, contendo:
- Dados de identificação do paciente e seu responsável;
- Dados do médico responsável pelo paciente;
- Médico alternativo existente;
- Procedimentos ou terapêuticas;
- Objetivos e justificativas;
- Possíveis riscos e desconfortos pertinentes ao procedimento;
- Benefícios esperados;
- Data, hora e assinatura dos envolvidos;
- Possibilidade de revogação por parte do paciente, sem qualquer penalização.
5- Use linguagem acessível
O médico deve fazer uma espécie de tradução dos termos técnicos, de modo que o paciente e/ou seu responsável entendam perfeitamente do que se trata. “Sob hipótese alguma a linguagem técnica deve ser utilizada sem o devido esclarecimento sobre seu significado”, reforça Laís.
Atenção à LGPD
Com os direitos previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a redação do Termo de Consentimento deve ser feita com muita atenção. É necessário esclarecer em quais circunstâncias os dados podem ser mantidos pelo controlar de forma segura, dispensando a eliminação.
Alexandre Martins afirma que o TCLE está protegido não só pela LGPD como também pelo dever de sigilo profissional que recai sobre a medicina, logo, seu conteúdo não pode ser exposto nem os dados do paciente.
Para efeitos da LGPD, consentimento é considerado “manifestação livre, informada e inequívoca pela qual o paciente concorda com o tratamento de seus dados pessoais para uma finalidade determinada”.