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Porque ser médico no Brasil vale a pena

Por:

Beatriz Soares & Mariana Lopes

- 10/03/2025

Porque ser médico no Brasil vale a pena

Por um lado, as exigências da profissão: dedicação, comprometimento, grande carga horária de trabalho, estresse e obstáculos. Por outro lado, os louros a serem colhidos: reconhecimento, retorno financeiro, o sentimento de dever cumprido e a gratidão dos pacientes.

Encontrando o equilíbrio nessa balança, profissionais renomados revelam porque vale a pena ser médico no Brasil hoje

“Ser ou não ser, eis a questão”. Muito se fala sobre a vocação para seguir a carreira dentro da Medicina. De certo, se identificar com o que faz é um dos passos essenciais para uma jornada de sucesso que leva o profissional a alcançar, entre tantos objetivos, o reconhecimento, o sucesso e a estabilidade financeira. Entretanto, o longo caminho para se tornar médico e construir uma carreira pode apresentar muitos obstáculos que levam ao questionamento: ainda vale a pena ser médico no Brasil?

Na edição #90 da Revista DOC, em homenagem ao Dia do Médico, celebrado em 18 de outubro, exploramos as principais vantagens da profissão e traçamos o perfil de renomados profissionais da Medicina brasileira para evidenciar que, apesar das dificuldades, ser médico no Brasil é uma escolha valiosa e gratificante.

Ao longo desta reportagem, destacamos alguns profissionais que representam o grande impacto e a relevância da Medicina, trazendo um panorama de suas conquistas e o papel essencial que desempenham, não apenas por suas habilidades e conhecimento clínico, mas também com a sua contribuição para a evolução da saúde e para o bem-estar da sociedade.

Margareth Dalcolmo
 
Nascida em uma família de juristas, a pneumologista Margareth Dalcolmo inicialmente aspirava a ser diplomata, uma escolha influenciada pelo ambiente jurídico e pelo respeito à Justiça que moldaram sua formação. Contudo, aos 17 anos, decidiu mudar de rumo e ingressou na Medicina, motivada por uma profunda introspecção e uma vontade de fazer a diferença em um momento de crise no Brasil durante a Ditadura Militar.

Sua trajetória acadêmica e profissional foi marcada por uma dedicação constante e uma curiosidade insaciável, que manteve ao longo dos anos. Entre os desafios enfrentados, a pneumologista destaca a adaptação a uma nova área de conhecimento e a busca por independência financeira durante a graduação, além de uma experiência precoce como diretora médica de um hospital federal, no qual liderou transformações significativas.

Ao se tornar membro titular da Academia Nacional de Medicina (ANM), a médica pôde contribuir para a saúde pública e a pesquisa clínica, alcançando reconhecimento significativo. Margareth conta que valoriza profundamente a vida e busca manter uma boa saúde para continuar a se dedicar tanto à Medicina quanto à escrita, sua outra paixão.

Conselho para os jovens médicos:
“Você não é médico apenas quando está no seu consultório, quando está no seu laboratório ou no seu trabalho. Você é médico o tempo todo. É uma escolha e um destino que você tem por opção.
Essa opção, aliás, deve ser muito serena, muito madura e cada vez mais confortável, sobretudo, para quem a fez.
Por isso é que vale a pena”.
Margareth Dalcolmo

Maior retorno financeiro

Segundo dados da Demografia médica, publicada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), a renda média mensal de um médico chegou a R$30,1 mil em 2023, o equivalente a 20 vezes o salário-mínimo no país. Comparada a outras profissões, a Medicina é a mais bem remunerada no Brasil.

De acordo com um levantamento de dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em 2023, realizada por meio de dados do IBGE, os médicos especialistas estão no topo da lista de salários do mercado de trabalho, enquanto os generalistas ocupam a terceira posição, atrás apenas de matemáticos e estatísticos.

Renda média mensal de profissionais no Brasil, segundo IBGE/FGV
 
1. Médicos especialistas – R$18.475 👈
2. Matemáticos e estatísticos – R$16.568
3. Médicos generalistas – R$11.022 👈
4. Geólogos e geofísicos – R$10.011
5. Engenheiros mecânicos – R$9.881
6. Engenheiros (sem outra classificação) – R$9.451
7. Engenheiros industriais e de produção – R$8.849
8. Economistas – R$8.645
9. Engenheiros eletricistas – R$8.433
10. Engenheiros de minas, metalúrgicos e afins – R$7.887
11. Engenheiros civis – R$7.538
12. Desenhistas e administradores de bases de dados – R$7.301
13. Advogados e juristas – R$7.237
14. Engenheiros químicos – R$7.161
15. Analistas de sistemas – R$7.005
GIF - Matéria UD - Revista DOC #90 (1)

Durante a faculdade de Medicina, o estudante precisa demonstrar um grande empenho e dedicação ao longo dos anos de curso. Após a formação, essa dedicação se intensifica ainda mais. Uma das principais características da profissão médica é que a remuneração, que está diretamente ligada à carga de trabalho.

Por isso, muitos médicos recém-formados acabam assumindo plantões longos ou consecutivos para garantir um retorno financeiro mais rápido, seja para construir sua carreira ou para conquistar sua independência. As longas jornadas de trabalho se tornam uma rotina para esses profissionais e continuam ao longo de suas carreiras, de acordo com seus objetivos.

Outro aspecto é a constante evolução científica, que exige que o profissional esteja sempre atualizado. Além dos plantões e atendimentos, o médico deve continuar se dedicando ao estudo para se manter informado sobre os avanços contínuos na área. Formar-se médico requer mais do que vocação: é preciso entrega e comprometimento. Considerando esses fatores, a remuneração se mostra, hoje, condizente com os anos de dedicação, abdicação e esforço.

Agnaldo Lopes
Agnaldo Lopes
 
O ginecologista Agnaldo Lopes, ex-presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) conta que, antes de iniciar sua carreira, foi fortemente influenciado pelo seu pai, um otorrinolaringologista que atuava em um município do interior do país. Já durante sua formação, interessou-se por Cirurgia Geral, mas, orientado por mentores, optou pela Ginecologia e Obstetrícia.

O médico considera a Medicina um privilégio e valoriza o impacto que pode ter na vida das pessoas. Ele acredita que a prática médica vai além do reconhecimento e retorno financeiro, sendo essencial a dedicação e a construção de uma relação de confiança com os pacientes.

Entre os desafios enfrentados, destaca a adaptação às mudanças rápidas no mundo e na Medicina, bem como a necessidade de manter os princípios éticos e humanos da profissão. Lopes acredita que a Medicina é uma combinação de assistência direta aos pacientes, pesquisa e ensino, e considera que seu envolvimento em diferentes áreas fortalece sua prática profissional.

Conselho para os jovens médicos:
“Um paciente que confia e entrega a sua vida a você: isso tem um peso muito grande. Então, valorizem isso. Valorizem a profissão e se dediquem à Medicina. Ser médico é muito bom e vale muito a pena”.
Agnaldo Lopes

Impacto na vida das pessoas

O retorno financeiro é crucial para equilibrar a carreira com a vida pessoal, pois a conquista da independência financeira requer recursos adequados. No entanto, além desse aspecto, a Medicina é uma profissão que tem um impacto profundo na vida das pessoas e o médico desempenha um papel significativo na comunidade em que atua.

Ao longo de suas carreiras, muitos médicos se dedicam de diferentes maneiras para assumir esse papel de liderança. Alguns se comprometem com estudos científicos, contribuindo para o avanço da prática médica. Outros se concentram em oferecer um atendimento humanizado. Há ainda aqueles que buscam fazer a diferença por meio de trabalho voluntário.

Grandes nomes que marcaram a Medicina

Adicionando ao legado uma parcela de empatia, esses profissionais são reconhecidos até hoje como importantes figuras:

Criador do procedimento conhecido como cirurgia de Jatene
Adib Jatene
1929-2014

Realizou o primeiro cateterismo no Brasil
José Eduardo Sousa
1934-2022

Criadora de um método revolucionário para o tratamento da esquizofrenia
Nise da Silveira
1905-1999

Fundadora da Pastoral da Criança
Zilda Arns Neumann
1934-2010

Luciana Rodrigues
Luciana Rodrigues
 
Ao contar brevemente sua história, a pediatra Luciana Rodrigues revela que iniciou sua carreira inspirada pelos pais, ambos médicos, e decidiu se tonar médica movida pelo desejo de cuidar das pessoas e melhorar suas vidas. Ao longo de sua trajetória, atuou como presidente da Sociedade Baiana de Pediatria e por duas vezes exerceu o cargo de vice-presidente e uma vez o de presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), onde contribuiu para importantes mudanças e ampliações de ações. Atualmente, faz parte da Academia Brasileira de Pediatria e da Academia de Medicina da Bahia.

Quando pensa nessas posições de liderança em que atuou, Luciana incentiva as mulheres a buscarem e assumirem cargos importantes, destacando a importância de lutar por seu espaço e trabalhar em parceria com os homens, enfrentando dificuldades com tranquilidade e valorizando as conquistas. A médica considera que a sua principal missão é ser mãe e pediatra e que os desafios foram extremamente gratificantes. Apesar das dificuldades, não mudaria seu caminho, acreditando que os obstáculos ajudaram a moldá-la como profissional e como pessoa.

Ao refletir sobre sua trajetória até aqui, ela entende que o reconhecimento profissional é importante e deseja continuar contribuindo para a comunidade nos próximos anos. Além disso, reforça que sua realização profissional vem da combinação de aprender, ensinar e contribuir para o crescimento de outros colegas, sempre buscando ampliar horizontes e melhorar a prática médica.

Conselho para os jovens médicos:
“Reflitam sempre, procurem se tornar pessoas melhores, individualizem seus pacientes, estudem muito e procurem sempre evoluir, colaborando e aprendendo com os colegas e com os familiares”.
Luciana Rodrigues

Maior reconhecimento social

Um dos trechos do juramento de Hipócrates diz: “prometo solenemente consagrar minha vida ao serviço da humanidade. A saúde e o bem-estar do meu paciente serão as minhas primeiras preocupações”. O reconhecimento social que vem como resultado da longa história de empenho e dedicação na carreira é algo que dá ao profissional a certeza de ter escolhido o caminho certo.

O prestígio que acompanha a carreira médica é um reflexo da importância e do impacto significativo que os médicos têm na transformação da vida das pessoas. Desde o momento em que se inicia a formação até o exercício profissional, os médicos são vistos como pilares de confiança e respeito, admirados por sua dedicação, habilidades e conhecimento, que são essenciais para a saúde e o bem-estar da comunidade.

Além disso, o respeito social trazido pela profissão também pode se traduzir em oportunidades para influenciar mudanças significativas, engajar-se em projetos de saúde global e construir uma carreira repleta de realizações pessoais e profissionais. Ser médico é, portanto, não apenas uma carreira de prestígio, mas uma oportunidade de fazer uma diferença real e duradoura no mundo.

Rosana Richtmann
Rosana Richtmann
 
Desde muito jovem, a infectologista Rosana Richtmann demonstrou um desejo claro de seguir a carreira médica, acreditando que a Medicina a escolheu. O seu percurso na profissão foi marcado por dedicação e aproveitamento de oportunidades. Em sua jornada, fez doutorado na Alemanha. Nesse período, ela destaca que enfrentou alguns desafios, como a barreira do idioma e a falta de comunicação constante com a família.

Entre suas conquistas, destacou o reconhecimento e a confiança de pacientes e colegas, além da presidência da Sociedade Paulista de Infectologia. Hoje, ela planeja se focar mais em projetos sociais, especialmente o Doutores das Águas, que oferece atendimento médico e odontológico a comunidades ribeirinhas da Amazônia.

Hoje, Rosana atua como consultora para o Ministério da Saúde e diretora de um comitê da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), além de equilibrar sua carreira com a vida familiar e seus projetos voluntários, evidenciando a versatilidade da profissão.

Conselho para os jovens médicos:
“Ame o que você faz. Tudo o que é feito com dedicação e amor se torna um trabalho muito bem-feito. O importante é estarmos dedicados e fazer com bom senso e com o coração envolvido em tudo aquilo”.
Rosana Richtmann

Campo fértil para crescimento contínuo

Uma das maiores vantagens de ser médico é a oportunidade contínua de estar na linha de frente do conhecimento científico e tecnológico. A Medicina é uma das áreas mais dinâmicas, na qual novas descobertas e avanços tecnológicos são constantemente desenvolvidos e integrados à prática clínica.

Esse ambiente de constante atualização não só mantém o trabalho desafiador e estimulante, mas também permite que os médicos ofereçam o melhor cuidado possível aos seus pacientes. Desde novos tratamentos e medicamentos até técnicas de diagnóstico e práticas avançadas, a constante atualização impacta diretamente a qualidade de vida dos pacientes e da população.

Além disso, devido a sua visibilidade e importância, a Medicina se beneficia constantemente de novas ferramentas que facilitam o trabalho dos profissionais. A alta prioridade que a Saúde ocupa no âmbito global atrai investimentos significativos em pesquisa e desenvolvimento, o que resulta em uma oferta constante de recursos para os médicos. Desde equipamentos de diagnóstico mais precisos e menos invasivos até sistemas de prontuários eletrônicos que melhoram a gestão do paciente, as inovações tecnológicas são continuamente integradas ao cotidiano do profissional.

Cristiano caixeta
Cristiano Caixeta
 
Desde jovem, o oftalmologista Cristiano Caixeta foi influenciado por um tio-avô, um respeitado otorrinolaringologista e oftalmologista, que serviu como exemplo de responsabilidade e respeito, o que o fez enxergar a profissão como uma forma de proporcionar cuidado ao próximo.

O médico começou sua jornada na Medicina aos 18 anos, mudando-se para fora de sua cidade natal para estudar, o que lhe deu uma visão abrangente das diferentes realidades da Medicina no Brasil. A experiência de viver em dois estados e interagir com diversas realidades médicas contribuiu significativamente para seu desenvolvimento profissional.

Em uma reflexão sobre sua carreira, Caixeta garante que não mudaria nada em sua trajetória, acreditando que cada escolha e desafio contribuíram para o seu crescimento e para o seu sucesso. Ele reforça que se sente realizado pelo reconhecimento profissional que recebeu, tanto de colegas quanto de pacientes.

O oftalmologista admite que se sente mais realizado ao relembrar as conquistas que obteve, tanto na carreira quanto na vida pessoal. Como membro vitalício do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), ele vê sua atuação como uma grande responsabilidade para construir políticas de saúde que beneficiem a população. Por fim, ele acredita que o sucesso na Medicina é resultado de um trabalho coletivo e ético, sempre pautado na dignidade e no respeito pela profissão.

Conselho para os jovens médicos:
“A Medicina é fantástica, apaixonante e viva. Ela é muito dinâmica. Vivemos hoje uma evolução assustadora, mas muito bonita dentro da Medicina. Todas as inovações que estamos trazendo para dentro da Medicina contribuem para que possamos cuidar melhor dos nossos pacientes”.
Cristiano Caixeta